O suicídio e o acompanhamento pastoral é tema de formação
Médico fala a padres da Diocese sobre formas de abordagem
20.10.2023 - 15:57:41

O bispo Dom Sergio Arthur Braschi, padres, diáconos, seminaristas, religiosos e pessoas que ajudam nas paróquias e movimentos com a função de escutar, participam até as 17 horas de hoje (20), no Espaço Cultural Sant’Ana, de um encontro de formação sobre ‘O fenômeno suicídio e o acompanhamento pastoral’. Trata-se de uma primeira reflexão a respeito do tema, promovida pelo grupo de sacerdotes intitulado ‘Padres Novos’, preocupado com o crescente número de atendimentos pastorais relacionados ao suicídio, principalmente entre adolescentes e jovens.
De acordo com um dos organizadores do encontro, padre Rafael Moreira, a ideia surgiu a partir de encontros mensais que o grupo realiza. A equipe iniciou com padres com menos de cinco anos de ordenação, mas, atualmente, conta também com sacerdotes ordenados há até dez anos. “Algumas vezes, nas partilhas, se ouvia sobre os atendimentos a respeito do suicídio. Porém, esse ano, com o movimento de confissões para as crismas, no mesmo dia, todos partilharam a mesma sensação: de que muitos e muitos jovens e adultos vinham falando da tentativa de suicídio, ou de pensamentos que já tiveram ou ainda tem. Diante dessa problemática, padre Matthias (Ham), que nos acompanha, nos questionou como caminhávamos com essas pessoas. E cada um de nós deu uma resposta, mas sem muita profundidade, não de forma concreta. Nesse dia, surgiu a ideia de buscar o médico para que viesse nos ajudar”, explica o administrador paroquial da Paróquia Menino Jesus, de Reserva.
A formação acabou sendo aberta a religiosos, diáconos, outros padres e às pessoas que ajudam nas paróquias e movimentos. “De uma maneira ou de outra, quem desempenha essa função de escutar pode ajudar o padre, porque a demanda é muito grande”, justifica padre Rafael. Para o padre Matthias Ham, a intenção é conhecer um pouco mais sobre o assunto e acabar com o tabu. “Mês passado, no encontro, eles disseram que estão se assustando com o número de adolescentes e jovens que têm ideias suicidais. Nos organizamos e, no dia de hoje, convidamos o médico (Augusto Bronzini), que é de Ponta Grossa, a nos ajudar a tratar desse assunto com mais ‘naturalidade’, tirar o medo de falar mais abertamente sobre o tema. Para isso, é necessário mais conhecimento e saber como encaminhar, como tratar o assunto. Muitos procuram o padre em primeiro lugar e, em muitos casos, é uma situação para psicólogos, psiquiatras”, ressalta o padre.
Tratamento
O formador Augusto Bronzini é graduado em Medicina pela Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG), em 2018; residente em Psiquiatria no Hospital Psiquiátrico São Pedro, de Porto Alegre (RS) e especialista em Atenção Básica pela Universidade Federal do Paraná. Possui publicações e apresentações nas áreas de Psiquiatria, Neurologia e Patologia.
Pela manhã, em sua fala, Bronzini alertava que os riscos sobem para médio e alto quando há casos semelhantes na família. “Quando ouvimos da pessoa que ela tem histórias sabidas de suicídio, essa pessoa tem médio ou alto risco de ser também um suicida. Um dos maiores riscos para a tentativa do suicídio é uma doença psiquiátrica. Se ela já tem uma doença, que normalmente tem base genética, essa questão da história é muito presente. O que a gente estuda na Psiquiatria é que alguns fenômenos se repetem, historicamente. Quando souberem que tem uma situação familiar de ocorrido, tem que sempre pensar que exista uma patologia por baixo daquilo, e, talvez fazer um referenciamento um pouco mais imediato, inclusive”, orienta o médico.
O uso de substâncias também é um dos maiores fatores de risco, afirma o médico. “Hoje, se sabe que só aumenta o uso de substâncias. Estamos vivendo um momento de aumento vertiginoso nas taxas de suicídio entre jovens, crianças, que tem reflexo também nas (taxas) de adultos. Mas, quanto às de crianças e adolescentes, se vê que essa geração está começando a se abrir um pouco mais. Quando se percebeu esse aumento na abertura, foi feito um estudo ao longo da história e se apurou que, sempre que a Humanidade passa por momentos de crise, catástrofes naturais, sociais ou financeiras, as taxas de ideação e de suicídio consumado, planejamento e automutilação aumentam. É preciso estar preparado para o aumento dessas taxas porque acabamos de passar por uma pandemia. Vários estudos mostram que os reflexos imediatos de uma pandemia se dão em cinco anos. Estamos vivendo os reflexos diretos e os indiretos que virão ainda por mais tempo. Vamos nos preparar para isso”, sugere Bronzini.
Automutilação
O médico ainda abordou as situações de automutilação entre adolescentes, que, segundo ele, vem ocorrendo cada vez mais e tem como motivador é o alívio de um sofrimento psicológico. “Eles preferem uma dor física do que uma dor sentimental. A partir disso, estamos vendo que as gerações que estão crescendo agora têm uma baixa capacidade de lidar com a frustração. Muito se estuda e se descobriu que muito disso advém das telas, da exposição às telas de celulares, tablets e computadores, desde o início da infância. Cada vez fica mais consolidado na literatura médica, que as telas muito cedo na vida das crianças vão deixá-las com menor capacidade de lidar com frustração. E essa dificuldade de lidar com a frustração também vai fazer com que não saibam lidar com os demais sentimentos que têm dentro de si”, explica.
Essa busca do alívio físico às vezes tem o intuito de tirar a vida, outras vezes, não, acrescenta. “Se perguntar porque fez (se automutilou) vai responder que estava se sentindo mal, que havia algo dentro dela e que queria tirar. Isso acontece cada vez mais. E é bem perceptível também que a incidência é maior entre as meninas, durante a adolescência. Isso está muito relacionado ao Transtorno de Personalidade Boderline, que é uma doença mais comum entre o sexo feminino.